O ChatGPT e a Educação: constrangimentos e potencialidades
A presente reflexão foi realizada no âmbito da unidade curricular de Materiais e Recursos Para eLearning, do curso de 2.º Ciclo, Pedagogia do eLearning, da Universidade Aberta e remete para a edição de um vídeo de exploração do ChatGPT, da sua visibilidade social, dos receios que introduziu na vida escolar e universitária e das potencialidades enquanto recurso educativo. Partindo da análise de artigos da comunicação social, pretendeu-se dar uma visão atualizada da forma como é visto, embora haja a consciência de que, no momento da publicação do vídeo, enquanto Recurso Educacional Aberto, o que é atual poderá já ter sido ultrapassado.
O ChatGPT é, segundo o próprio, “um modelo de linguagem de grande escala desenvolvido pela OpenAI, que foi treinado com milhões de exemplos de conversas na internet para responder a perguntas em natural linguagem. Ele é capaz de responder a uma ampla gama de perguntas sobre vários tópicos, como história, tecnologia, entre outros.” Lançado em novembro de 2022, superou o Instagram que demorou dois anos e meio a atingir os 100 milhões de utilizadores e o TikTok que levou nove meses (Aguiar, 2023).
Construído a partir do GPT3 (Generative Pre-trained Transformer-3), também da OpenAI, a expressão refere-se a um modelo de linguagem complexo que calcula a probabilidade em sequência de palavras (Hernandes, 2023). Na prática, este demonstrador mantém uma conversação com o utilizador, pelo que, para além, de pesquisar, constrói textos, elabora sínteses, elenca tópicos sobre determinados assuntos, traduz e pode, inclusivamente, criar mensagens, desde que as solicitações/instruções que lhe são fornecidas sejam claras. Trata-se de um “modelo aperfeiçoado de processamento de linguagem com sistemas de machine learning. O que significa que consegue aprender continuamente conforme o feedback que os utilizadores fornecem” (Antunes, 2023), ou seja, tudo o que for introduzido na internet como novidade não é aproveitado pelo ChatGPT no imediato. Da mesma forma, todas as informações pouco rigorosas ou as fake news poderão estar a alimentar este gigante e serem fornecidas como fidedignas, porque integradas num texto articulado e com algum grau de complexidade.
Há, portanto, constrangimentos que devem ser tidos em conta, pois “as plataformas de IA podem de facto ajudar, ou no limite substituir, o ser humano, mas apenas em contextos puramente processuais ou procedimentais” (Rosa, 2023), uma vez que os traços individualizadores não são ainda possíveis de replicar. O ChatGPT não reproduz o estilo do seu utilizador, limita-se a criar um texto pouco fluente, construído com períodos curtos. Outro constrangimento, prende-se com os direitos autorais. Da mesma forma que, comummente, na medicina, ainda não é a IA a ajudar os técnicos, mas sim estes que a supervisionam (Sciences, 2022), também o ChatGPT “não tem a capacidade de determinar se suas respostas infringem as leis de direitos de autor. É da responsabilidade do utilizador garantir que o uso das respostas do ChatGPT esteja em conformidade com as leis e regulamentos relevantes.” (Antunes, 2023).
Efetivamente, as preocupações éticas têm sido uma constante no mundo da IA e Paulo Dimas (2023), VP de Inovação na Unbabel, refere que foram ultrapassados três pilares essenciais: o primeiro é o preconceito, que foi algo que travou a Google de lançar anteriormente o seu modelo LAMBDA. O segundo foi a eliminação do conteúdo tóxico, tais como o racismo. Por fim, foram criadas salvaguardas para evitar, por exemplo, que os utilizadores criem conteúdos perigosos.
Os comentadores parecem concordar com o facto de que o ChatGPT trouxe a IA ao grande público e que este mundo complexo possa “em breve estar ao serviço de qualquer pessoa e a perceber exatamente o que queremos, da forma como queremos e entregar exatamente o que queremos.” (Mateus-Coelho, 2023). Efetivamente, o seu raio de ação passou os limites laboratoriais e está agora disponível em jeito de conversação, à espera de ser suplantado, se é que, neste preciso momento, isso não está já a acontecer, pois os avanços da tecnologia ocorrem a um ritmo alucinante.
O vídeo pretende dar uma visão descontraída desta ferramenta que, em primeira instância, se afigura aterradora para os professores, por poder ludibriar o seu trabalho. É, efetivamente, necessário oferecer um momento de discussão e de partilha de receios, mas também de ideias, pretendendo-se em última instância consciencializar de que o ChatGPT é real, que os nossos alunos o utilizam, que muitos professores também e que tem potencialidades para introduzir abordagens inovadoras e aliciantes para os alunos e que, claro está, tem constrangimentos que têm de ser acautelados e ultrapassados.
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Na produção de vídeo, no que concerne às propostas de abordagem didática, para além das apresentadas pelo próprio ChatGPT e que se prendem com as valências acumuladas de motor de busca e tradutor, foram sugeridos dois trabalhos relacionados com algumas fragilidades desta ferramenta relacionadas com a construção de texto e com o processamento de texto replicado que poderá interferir com os direitos de autor. Considerando que estas são também duas das maiores fragilidades dos alunos à saída do ensino secundário (não ter ainda adotado um estilo de escrita ou não o reconhecer e transferir conteúdo pesquisado diretamente para trabalhos, sem preocupações de proteção de direitos autorais), seria uma forma interessante de atenuá-las, uma vez que o esforço de apropriação e personalização de um texto e de inclusão de citações e referências bibliográficas seria solicitado em várias disciplinas, promovendo um trabalho colaborativo que, com grande certeza, seria mais profícuo. A terceira sugestão decorre da chamada de atenção para a necessidade de mudança na avaliação. Embora considere que a avaliação devesse recair em larga medida na comunicação oral e na defesa de trabalhos, não me parece que esta alteração possa ocorrer com celeridade, dado o peso da avaliação externa na determinação do futuro dos alunos. Efetivamente, na era digital, a viver a Quarta Revolução, é ponto assente que o trabalhador deve ser alguém que utiliza as tecnologias de forma crítica e expedita e que converte o conhecimento disponível na internet em aprendizagens de inclusão e de desenvolvimento de competências. Cada vez mais há a adoção do trabalho colaborativo que requer competências da comunicação, pelo que seria muito pertinente que a escola cultivasse o gosto pela exposição, pela argumentação através da participação em debates, por exemplo. No entanto, assiste-se a um ritmo alucinante de tarefas escritas para cumprir programas e preparar para a avaliação externa. Nesse sentido, penso que o ChatGPT levanta a questão no seio do grupo de docentes se vale a pena a solicitação de débito de conteúdos ou o tratamento dos mesmos nas vertentes escrita e oral. A diversidade de disciplinas no grupo de trabalho permitirá com certeza o acréscimo de potencialidade do ChatGPT, enquanto recurso educativo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Antunes, D. (21 de 02 de 2023). ChatGPT infringe direitos de autor? Obtido de Observador: https://observador.pt/opiniao/chatgpt-infringe-direitos-de-autor/
Biro, J. (2019). Pierre Lévy e a cibercultura. Obtido de Contrafatual: https://contrafatual.com/2019/12/15/pierre-levy-e-a-cibercultura/
Dimas, P. (20 de 02 de 2023). ChatGPT: “Estamos a viver um momento histórico no uso de Inteligência Artificial”. (R. Parreira, Entrevistador) Obtido de https://tek.sapo.pt/noticias/computadores/artigos/chatgpt-estamos-a-viver-um-momento-historico-no-uso-d
Gomes, P. J., & Martinho, J. L. (2023). ECURSOS HUMANOS NA ERA DA QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL: REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA SOBRE COMPETÊNCIAS PARA A INDÚSTRIA 4.0. RAE - Revista De Ativos De Engenharia, 17-29. Obtido de https://doi.org/10.29073/rae.v1i1.646
Hernandes, R. (22 de 02 de 2023). O que você precisa saber sobre ChatGPT, OpenAI e inteligência artificial na linguagem. Obtido de Folha de São paulo: https://www1.folha.uol.com.br/tec/2023/02/o-que-voce-precisa-saber-sobre-chatgpt-openai-e-inteligencia-artificial-na-linguagem.shtml#como-o-chatgpt-foi-feito
Mateus-Coelho, N. (23 de 02 de 2023). O ChatGPT não é o mau da fita... ou será? Obtido de CNN Portugal: https://cnnportugal.iol.pt/chatgpt/polemica/nuno-mateus-coelho-o-chatgpt-nao-e-o-mau-da-fita-ou-sera/20230223/63f78a380cf2c84d7fc969e7
PierreLèvy. (1999). Cibercultura . Editora 34 .
Ricoy, M. C., & Couto, M. J. (2012). Os recursos educativos e a utilização das TIC no Ensino Secundário na Matemática. Revista Portuguesa de Educação, pp. 241-262.
Rosa, C. (22 de 02 de 2023). O ChatGPT é só um Google 2.0! Obtido de Diário de Notícias: https://www.dn.pt/opiniao/o-chatgpt-e-so-um-google-20-15878113.html
Sciences, A. F. (Produtor), & Ribot, J.-C. (Realizador). (2022). Aitópsia de uma inteligência artificial [Filme]. Obtido de https://www.rtp.pt/play/p10918/autopsia-de-uma-inteligencia-artificial
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